Após barbárie, colégio onde vítimas de estupro estudavam muda rotina
A rotina dos alunos da Unidade Escolar Francisco Sales
Martins, em Castelo do Piauí, mudou depois que quatro garotas, sendo três delas
colegas de classe, foram agredidas, violentadas e arremessadas do alto do
penhasco com cerca de 10 metros de altura.
Mais de 20 dias depois, a tragédia ainda mostra suas marcas.
Inconsolável, a turma na qual estudavam três das vítimas mudou de sala. Com
medo, os pais agora deixam os filhos na porta do colégio, onde o clima de luto
é evidenciado por um aviso na fachada.
Uma das vítimas, Danielly Rodrigues, de 17 anos, faleceu 10
dias após o crime. Das três sobreviventes, uma ainda está internada Hospital de
Urgência de Teresina (HUT), e, segundo os médicos, não corre risco de morte. As
outras duas tiveram alta e estão na casa de familiares.
Cinco pessoas são suspeitas da série de atrocidades
cometidas contra as meninas. Um traficante de 40 anos, que estava foragido da
Justiça de São Paulo, foi preso sob suspeita de ser o mentor da barbárie. Entre
os investigados, estão quatro adolescentes, também entre 15 e 17 anos, que
foram apreendidos horas após o crime. Dois deles confessaram.
O grupo foi denunciado pelo Ministério Público que pediu
pena de 151 anos para o adulto e aplicação de medida socioedutiva, no Centro Educacional
Masculino (CEM), para os garotos.
Amiga mudou de turno na tentativa de diminuir o sofrimento |
Três das quatro garotas estudavam na mesma sala, cursavam o
3º ano do ensino médio, e, de acordo com relato de professores, o grupo formado
por mais uma adolescente se destacava na classe. A ausência delas é sentida por
todos.
Uma das amigas mudou de turno na tentativa de diminuir o
sofrimento ocasionado pela falta das colegas. No dia do crime, a estudante, que
pediu para não ser identificada, recebeu o convite para ir, junto com as
vítimas, até o Morro do Garrote, mas naquele dia preferiu ficar em casa. A
garota que retornou para a escola somente na terça-feira (16/06), 19 dias após
o crime, se emociona ao falar da convivência com as amigas.
“Não dava para continuar na mesma classe porque tudo lembra
elas. Sentávamos todas próximas e fazíamos trabalhos juntas. Chegar à sala e
não vê-las é muito difícil, por isso pedi para mudar de turno. Na nova classe,
eu tento assistir às aulas normalmente, mas está difícil”, afirmou.
A jovem Danielly era uma das amigas mais próxima. Descrita
com animada e estudiosa, a adolescente morreu 10 dias após o crime. "E de
todas, a Dani era a mais organizada. Era a que se cobrava a perfeição nos
trabalhos da escola. Nós tínhamos ela como nossa líder por ser destacada,
alegre e brincalhona", afirmou.
Uma das escadas da unidade escolar, que era o canto
preferido das garotas durante o recreio, agora é evitada para não trazer
lembranças. “Não quero olhar para a escada porque sempre ficávamos conversando
lá”, disse.
Emocionada, a garota pede para encerrar a entrevista, mas
antes escreve num pedaço de papel as qualidades das amigas vítimas do crime que
chocou o país.
Com a tragédia de Castelo, o clima de medo também faz parte
do cotidiano dos moradores da pequena cidade. Segundo a diretora Lucineide
Silva, depois do crime, os pais passaram a acompanhar os filhos durante a
chegada e saída da escola.
“Nosso corpo discente é formado por adolescente e jovens que
antes vinham sozinhos, mas, agora, muitos pais estão vindo deixar e pegar os
filhos com medo da violência”, contou.
Outra mudança que ocorreu na escola foi a transferência dos
alunos do 3º ano para outra sala. A diretora comentou que a decisão aconteceu
para estimular o retorno dos alunos, após a barbárie. “Também fizemos isso para
evitar os comentários dos amigos de classe. Não queríamos ver eles apontando o
local onde elas sentam”, disse.
Vinte um dia após o crime, o clima de tristeza ainda é
presente da escola. Além da faixa com a palavra luto continuar no muro da
escola, a mesma expressão foi escrita em várias cadeiras da instituição de
ensino.
Lucineide Silva pediu ajuda para a Secretaria Estadual de
Educação, que realizou uma reunião na terça-feira (16/06) visando um
planejamento estratégico para enfrentar o trauma vivido. “Vamos organizar
palestras e encontros com os pais. Professores e psicólogos vão unir forças
para ajudar pais e alunos a superar o medo e a dor”, finalizou.
Fonte: G1
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